Há inúmeros fatores que influenciam uma negociação. Um dos mais estudados é racional e é a análise da melhor alternativa que a outra parte pode ter, BATNA em inglês, “best alternative to a negotiated agreement”.

A resiliência do investimento publicitário em televisão, nalguns mercados como o português, é muito justificada pelos seus custos por contacto mais baixos e pelas elevadas e rápidas coberturas. O digital apesar de mais “trendy” e oferecer a possibilidade de se medir quase tudo perde ainda para essa “melhor alternativa” em muitos casos.

Mas entre os fatores emotivos há um que também pode justificar dificuldades para o negócio da publicidade digital. Apenas nos livros de gestão ele aparece frequentemente referido como impedimento a um bom acordo de negociação, mas não é rara a sua interferência. Esse fator é a inveja.

E ele surge quando estamos perante uma boa hipótese de acordo para nós, mas percebemos que o mesmo acordo para a outra parte é ainda melhor, ou até muito melhor. Emocionalmente é muito difícil lidar com essa informação e ainda assim fechar o acordo.

Este fator revela-se desde as nossas simples compras recorrentes até às grandes negociações pessoais, geralmente a compra de um carro ou de um imóvel.

Quantos de nós travaríamos o impulso de compra de uns ténis de marca se exibissem na etiqueta o seu custo de fabrico ou “preço de fábrica”? Continuaríamos a achar razoável dar mais de 100 euros por algo que tinha custado menos de 30 a fabricar?

E venderíamos o carro em retoma se soubéssemos que o comprador tinha em mente já uma potencial revenda por um valor significativamente mais alto? Esta reação emocional atrapalha a racionalidade de todas as negociações.

Os exemplos são infinitos mas tendem a ser mais frequentes quando temos mais informação, embora também haja situações que contrariam este fator.

Este fator perde força quando não temos alternativa e a necessidade é elevada, situações em que aceitamos a especulação. É verdade na compra de uma casa, que por vezes sabemos que custava menos 30% há 1 ano ainda em fase de construção, mas é o melhor negócio que temos disponível, e também na negociação de títulos em bolsa por exemplo. Temos imensa informação mas temos que colocar a emoção de lado se queremos operar nesses mercados, onde é comum essa “inveja” se traduzir em “ganância” no desejo de replicarmos o feito a nosso favor.

O que em mais de 20 anos se assistiu no mercado da publicidade digital foi uma evolução que passou do entusiasmo que a capacidade extraordinária de segmentar e medir tudo justificava um prémio no preço, para um sentimento cada vez mais influenciado pelo sentimento de indisponibilidade para pagar mais do que o impacto direto que essa publicidade gera no negócio do comprador. Em todos os outros meios se assume que uma parte gerará vendas imediatas e outra parte do investimento se justifica porque constrói relação dos consumidores com a marca e reforça atributos que a diferenciam.

Mas no digital, criou-se a ideia da “performance”, em que alguns prometem investimento com retorno garantido. Claro que se é possível pagar menos, ninguém irá pagar mais, e por isso a discussão de se é ou não justo pagar pela promoção da marca, e apenas pelos incrementos diretos em vendas, é uma perda de tempo.

O que se deveria equacionar é se essas medições são de facto corretas. As marcas conseguem esses retornos na “Performance” independentemente do valor que já construíram, ou dos investimentos que já fizeram, ou fazem em simultâneo, nos outros meios? A resposta mais provável é que não.

Mas o preço é sempre o encontro da oferta e da procura e, se a procura dotada de imensa informação que o digital dispõe consegue avaliar o preço “ideal” porque aceitará pagar mais? Combina-se o fator inveja descrito, em que a informação nos permite quantificar quanto pagamos acima do retorno direto em vendas, com a melhor alternativa que os outros meios oferecem, precisamente porque não permitem essa medição.

Se juntarmos a tudo isto que quem fixa o preço na publicidade digital é muitas vezes uma terceira parte que beneficia de preços baixos para melhor competir com os outros meios, e que não tem custos na produção de conteúdos, percebemos que esta ideia de “performance” tornou o preço da publicidade digital vítima da enorme quantidade de informação que o digital disponibiliza. A grande vantagem competitiva poderá ter-se tornado na sua maior desvantagem competitiva atual.

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