Uma tela enorme, negra, com linhas equidistantes, losangos a convergir para um centro que não está marcado, meios círculos pintados de cores florescentes, uns sobre os outros, como um arco-íris. Há peças de Frank Stella (1936-2024) que são quase imediatamente reconhecíveis. Stella, um dos mais importantes artistas norte-americanos do século XX, conhecido por estilhaçar todos os campos artísticos associados ao abstracionismo, e pela utilização de padrões e formas geométricas na criação de pinturas e esculturas muitas vezes gigantescas, morreu em casa, em Nova Iorque, vítima de linfoma, disse a sua mulher, Harriet E. McGurk.

Nascido a 12 de maio de 1936 em Malden, Massachusetts, Stella estudou História na Universidade de Princeton antes de se mudar para Nova Iorque em 1958. Foi aí que mergulhou no mundo do Expressionismo Abstrato, e por isso no mundo de Jackson Pollock, Mark Rothko, Willem de Kooning, Barnett Newmann, Clyfford Still. Os seus “quadros frugais”, foram feitos em resistência a este movimento, não continham qualquer cor, não eram entretenimento artístico nem visavam providenciar qualquer estímulo visual. Stella defendia que “o que vês é o que vês”, uma forma de ver a arte despida de qualquer significado anterior ou posterior à sua execução, pelo menos para o artista. Esse é ainda o lema do minimalismo hoje.

Para muitos, Stella continua a ser mais conhecido pelos seus ‘Black Paintings’, uma série que começou com quatro quadros expostos no Museu de Arte Moderna de Nova Iorque quando Stella tinha apenas 23 anos e que acabou por incluir cerca de 24 telas de grande escala, cada uma composta por faixas concêntricas ou riscas brancas sobre preta, rígidas, rigorosas, inescapáveis. Esses são os quadros mais facilmente identificáveis com o artista, tal como os blocos de cor de Rothko são aqueles que toda a gente cita, apesar de o artista ter vários outros momentos na sua carreira, longe das opressivas janelas a negro ou roxo que pintou em gigantescas telas.

“A abstração não tinha de se limitar a uma espécie de geometria retilínea ou mesmo a uma simples geometria curva. Podia ser uma geometria que tivesse um impacto narrativo. Por outras palavras, podia-se contar uma história com as formas”, explicou o próprio Stella, num perfil publicado no site ArtNet. “Não seria uma história literal, mas as formas e a interação das formas e das cores dariam um sentido narrativo. Poderíamos ter a sensação de uma peça abstrata a fluir e a fazer parte de uma ação ou atividade”, disse ainda.

Um dos quadros minimalistas de Frank Stella, em exibição do Museu de Arte Contemporânea de Teerão, em 2022

ATTA KENARE

A sua intenção subversiva foi o motor da sua arte. O seu trabalho aproximou-se em muitos momentos de uma forma de abstração de grau zero, as suas pinturas tornaram-se maximalistas, são cores arrebatadoras dispostas em padrões dos quais é difícil desviar o olhar. Um dos seus legados indiscutíveis é a produção de telas não retangulares, que apontam mais para o domínio da escultura. Com o tempo, as suas obras começam literalmente a sair da parede, materializando-se em construções fluidas e compactas ao mesmo tempo, como são exemplos as suas esculturas inspiradas pela forma do fumo dos charutos cubanos, que, no final dos anos 80 e até 2017, continuaram a inspirá-lo. Os seus “Anéis de fumo”, como são conhecidas as composições que fez com “fumo”, são flutuantes, tridimensionais e feitos de fibra de vidro pintada ou tubos de alumínio.

Stella descrevia o progresso do seu trabalho a partir do final dos anos 50 como uma passagem do “minimalismo para o maximalismo”, como escreve a curadora Kate Nesin na introdução do livro da Phaidon sobre o artista. “Foi como, se ao proclamar as suas próprias tendências subsequentes, aceitasse o ‘ismo’ de um lado apenas para o abandonar. Assim, chegamos ao que parece, em retrospetiva, uma trajetória concertada que se afasta da redutibilidade das ‘Pinturas Negras’: só nos anos 60, as obras às riscas dos primeiros anos dessa década deixaram de ser retangulares — primeiro, os cantos foram cortados, depois, as telas ganharam formas mais radicais, acabando por se tornar laterais e a abranger paredes inteiras.”

A peça “Rzochow”

No final da década de 60 deu início a outra série que também o definiria para a posteridade, tal como os quadros negros haviam feito 10 anos antes. Embarcou na ambiciosa série “Protractor” — “transferidor”, em português, e fez mais de 100 pinturas de tamanho mural repletas de meios-círculos sobrepostos de cores brilhantes, por vezes fluorescentes. As pinturas, que têm realmente a forma de meio-círculo de um transferidor e parecem ter sido inspiradas só por isso mesmo, “elevam toda a noção de abstração cromática a um ponto de elaboração quase barroca”, escreveu Hilton Kramer no “The New York Times”, na altura em que as peças foram exibidas.

Frank Stella ficou conhecido muito cedo, com 23 anos, numa exposição em 1959, no Museu de Arte Moderna de Nova Iorque, onde levou precisamente os seus quadros negros com simetrias brancas. “Um gigante da arte abstrata do pós-guerra, a obra extraordinária e em constante evolução de Stella explorou as possibilidades formais e narrativas da geometria e da cor e as fronteiras entre a pintura e o objeto”, afirmou a sua representante em Nova Iorque, a Galeria Marianne Boesky, no anúncio do falecimento do artista,citada pelo site ARTNews.

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